Substancial
Airton Brabo de Sousa
O vento frio da madrugada entrou pela janela
E a chuva que era bela, caía bem devagar
Mas dava pra molhar, com a mão me benzi
Levantei num piscar, é hora de partir
Atrás do tesouro do dia, o meu suado pão
Sagrada obrigação de homens e animais
A natureza faz a vida ser assim,
É caçada sagaz, pra você e pra mim
O remo na água faz desenhos abstratos
É colher dentro de um prato, caldo de peixe é o rio
Que ainda espreguiça sob um lençol de neblina
E abraça a minha sina de cidadão arredio
Talas de pachiúba juntas pela margem da ilha
Astuta armadilha pros peixes que virão
Nadando em procissão enchendo o cacuri
Inda tem camarão, inda tem açaí...
Nas reflexões que eu faço sempre pensei sem custo
Que seria bem justo ratear o que se ganha
Sem qualquer artimanha, a vida partilhada
No fim desta façanha ninguém vai levar nada
A chuva cessou, mas ainda é mês
de maio
E os casais de papagaios voando
na imensidão
Tem garça pescando, andorinhas
revoando
Meus olhos se deleitando, como é
linda a Criação!
Entre um estirão e outro tem casa de amigo
Hospitaleiro antigo pra qualquer ocasião
Causa admiração o seu acolhimento
Café na sua mão me estende em cumprimento
E eu sigo então o meu caminho de água e destino
E o Sol já cristalino soberbamente espia
Sumirem as Três Marias e o resto do astral
Cingindo com o dia o espaço sideral
Na volta pra casa penso em minha odisseia
Minha simples epopeia é alimentar os meus
Enquanto tem outros usurpando a natureza,
Chafurdando na avareza, se achando o próprio Deus!
Tem gente que nasceu aqui, mas
inda não notou
A Lua que mergulhou no horizonte
frio
Borboletas no rio, numa nuvem
amarela
Cupuaçu, abiu, canoa de remo e
vela...
Enquanto na cidade gente de calça
jeans ou terno
Se achando tão moderno sem ver o
Sol maior
Eu só queria expor nesta simples canção
De onde vem o melhor da sua
alimentação!
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